25 Apr 2024


Procura por cannabis medicinal cresce 138%

Publicado em Saúde
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Cada vez mais se fala no uso de medicamentos à base de canabidiol (CBD) para auxiliar no tratamento de doenças como epilepsia, autismo, dores crônicas e até depressão. Trata-se de um mercado em franca expansão no país há cinco anos, desde quando a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) liberou a importação de medicamentos à base de canabidiol. E foram regulamentadas a fabricação e a venda de produtos feitos com cannabis para uso medicinal nas farmácias brasileiras, mediante à prescrição médica. De 2015 a 2020, a Anvisa registrou aumento anual no número de pacientes cadastrados para importação desses medicamentos. Em 2020 o aumento foi de 138,92% em relação a 2019. Em entrevista exclusiva, a Folha do ABC, João Paulo Perfeito, gerente da Gerência de Medicamentos Específicos, Notificados, Fitoterápicos, Dinamizados e Gases Medicinais (GMESP) da Anvisa e também o médico Neurologista Renato Anghinah, pesquisador sobre assunto e que prescreve medicamentos à base de canabidiol a seus pacientes revelam detalhes sobre o uso do medicinal. Anghinah é diretor da HempMeds, primeira empresa autorizada da Anvisa para importar produtos à base de canabidiol para o Brasil. Confira os principais trechos da entrevista. 

 

Folha do ABC: Em relação aos produtos à base de canabidiol, quantos e quais estão aprovados para venda no Brasil? 

João Paulo Perfeito - Temos atualmente aprovados pela Anvisa:  um medicamento registrado à base da associação Tetraidrocanabinol + Canabidiol: Mevatyl (27 mg/mL + 25 mg/mL); e  um produto de Cannabis autorizado nos termos da RDC 327/2019: Canabidiol Prati Donaduzzi, nas concentrações de 200 mg/mL, 50 mg/mL e 20 mg/mL. 

 

Folha - Como funciona o processo de aprovação do produto? 

João Paulo - As solicitações baseadas na RDC 327/2019 são submetidas eletronicamente pelas empresas fabricantes/importadoras por meio de sistema acessado pelo portal da Anvisa. Estas solicitações devem vir acompanhadas de todas as evidências previstas na norma, de forma a garantir a qualidade e a segurança do produto. 

Em razão de tratar-se de produto para tratamento ou manejo clínico de pacientes sem alternativa terapêutica, a Anvisa, neste primeiro momento, vem dando prioridade para as análises dessas solicitações. Isso significa que estes pedidos são encaminhados para análise técnica de forma priorizada. Após a avaliação técnica, a Anvisa poderá concluir pela aprovação ou reprovação do produto, ou ainda, solicitar esclarecimentos ou documentação complementar à empresa, com vistas a comprovar a qualidade e a segurança do produto, conforme o disposto na RDC 327/2019. Neste último caso, a empresa tem até 120 dias para apresentar as informações e documentos solicitados pela Anvisa. Estas informações e documentos retornam para análise técnica, podendo resultar na aprovação ou reprovação do pedido de autorização sanitária do produto. 

 

Folha - A venda de medicamentos à base de cannabis só pode ser feita com prescrição médica e importados somente por pessoas físicas. Qual o número de pacientes cadastrados para importação desses medicamentos? O número aumentou em relação aos anos anteriores? 

João Paulo - O número de pacientes cadastrados por ano no portal da Anvisa é  2015 - 825; 2016 - 469; 2017 - 1390; 2018 - 2360; 2019 - 6459; 2020 - 15432. 

 

Folha - A Anvisa recebe pedidos de autorização para medicamentos à base de canabidiol. Os pedidos são para importação de insumos para fabricação no país ou para trazer o produto pronto para uso?  Quantos pedidos foram feitos em 2020?    

João Paulo - Aqui é importante esclarecer que existem duas possibilidades de regularização dos produtos: como medicamento; ou como produto de Cannabis, pela RDC 327/2019. 

Os pedidos feitos à Anvisa incluem casos em que se importará o insumo para fabricação do produto de Cannabis no Brasil, bem como casos de importação do produto pronto para uso. Em 2020 foram submetidos 9 (nove) pedidos de autorização sanitária de produtos de Cannabis nos termos da RDC 327/2019. Destes, um foi aprovado pela Anvisa, para dois deles houve a desistência do pleito por parte da empresa solicitante e os demais encontram-se em exigência, que é quando a Anvisa solicita informações ou documentos complementares à empresa, com vistas a comprovar a qualidade e a segurança do produto nos termos da RDC 327/2019. Nenhum pedido foi reprovado pela Anvisa. 

Até o momento, só houve uma solicitação à Anvisa de registro de medicamento à base de derivado de Cannabis. Esta solicitação foi aprovada em 2017. 

 

Folha - É permitido empresas e laboratórios desenvolverem medicamentos à base de canabidiol no país? Quais critérios a empresa precisa atender para importar insumos? 

João Paulo - Sim, é permitido. Conforme disposto no art. 18 da RDC 327/2019, para fabricação e comercialização de produto de Cannabis, em território nacional, a empresa deve importar o insumo farmacêutico nas formas de derivado vegetal (como por exemplo: extratos, tinturas, óleos, entre outros), fitofármaco (canabidiol), a granel (produto semi-elaborado, que ainda passará por alguma(s) etapa(s) para finalizar sua produção), ou produto industrializado (produto pronto para uso). As empresas que desejarem importar os insumos para fabricação de produtos de Cannabis no Brasil deverão atender ao disposto na RDC 327/2019 e demais normas complementares, resumidamente, as empresas deverão atender aos seguintes requisitos: possuir autorização de Funcionamento de Empresa (AFE) emitida pela Anvisa com atividade de fabricar ou importar medicamento; autorização Especial (AE); certificado de Boas Práticas de Fabricação (CBPF) de Medicamentos para a empresa fabricante do produto; e boas Práticas de Distribuição e Armazenamento de medicamento.

 

Anghinah: “desinformação e preconceito são os principais desafios”

 Neurologista e livre-docente em Neurologia pela Faculdade de Medicina da USP, Renato Anghinah (foto) é diretor da HempMeds, primeira empresa autorizada da Anvisa para importar produtos à base de canabidiol para o Brasil. Anghinah é pesquisador sobre o tema e também prescreve medicamentos à base de canabidiol.

Folha do ABC - O sr. é um grande pesquisador sobre o uso de Cannabis Medicinal no tratamento de diversas doenças. Como começou a se interessar sobre o tema?

Renato Anghinah - Em 2014 a Anvisa, passa a autorizar produtos a base de Cannabis, para uso medicinal, porém comecei, de fato a me interessar na prescrição desta nova alternativa terapêutica em 2016, inicialmente para pacientes com quadros de epilepsia de difícil controle.

Folha - Além de pesquisador sobre o tema, o sr. prescreve a seus pacientes o uso de Cannabis medicinal. Em quais casos os medicamentos à base de Cannabis auxiliam no tratamento?

Anghinah - Apesar do sistema Endocanabinoide ter sido descrito na década de 1980 par Meshulan em Israel, em parceria o grande Prof. Carlini , da UNIFESP,  brasileiro falecido no ano passado, as pesquisas clínicas passam a ser mais relevantes a partir da última década e principalmente após 2014.

As primeiras pesquisas bem estruturadas em humanos foram para epilepsia, onde mostram grande eficácia e indicação para muitos casos, já incorporadas a consensos médicos. Outras três áreas com ótimos estudos clínicos incluem Autismo, dores neuropáticas e dores crônicas, ansiedade e espasticidade em doenças como esclerose na múltipla ou após paraplegia por traumas na coluna (medula).

Outras áreas tem despertado grande interesse de pesquisa, mas ainda com estudos pré-clínicos (em animais) ou iniciando estudos em humanos. Estas áreas precisam de resultados mais consistentes e a possível utilização destes medicamentos a base de Cannabis deve ser feita por médicos que dominam o assunto e em situações muito bem estabelecidas.

Folha - E quais casos tem resultado mais significativo com o uso do medicamento?

Anghinah - Epilepsia, autismo, dores crônicas refratárias ao tratamento têm boas respostas.

 Folha - Recentemente o sr. assumiu como Chief Medical Officer (CMO) Global da HempMeds, empresa de Cannabis medicinal com operações no Brasil. Poderia comentar sobre o trabalho frente à companhia?

Anghinah - O meu trabalho é bastante gratificante, pois atuo promovendo pesquisas diretas e indiretamente junto a pesquisadores e universidades , divulgando ciência através de cursos de educação continuada e discussão e casos clínicos com os colegas médicos e com base científica, dando o suporte para a melhor indicação dos produtos da HempMeds, para as diferentes patologias. Nossa ação engloba principalmente o Brasil, México e Estados Unidos.

Folha - Quais os principais desafios para ampliação do uso do Cannabis medicinal no Brasil?

Anghinah - Certamente e a desinformação sobre os seus benefícios, quando transformam os produtos medicinais extraídos da Cannabis, em panaceia e solução para todas as doenças , de forma cega e longe da medicina baseada em evidências.

Por outro lado, o outro grande desafio e o preconceito, por falta de entendimento que estes produtos são derivados da mesma planta da maconha, mas são compostos controlados farmacológicamente, com diferentes proporções de seus componentes, para uso terapêutico, muito diferente da maconha “in natura” para uso recreacional.

Folha - A vivência do sr. no Hospital das Clínicas e muitas pesquisas, lhe rendeu bagagem para, em breve, lançar o livro “Reconstruindo o Cérebro”. Poderia comentar um pouco sobre o que será abordado no livro?

Anghinah - Trata-se de um Romance de Ficção, que conta de forma amorosa, a estória de um jovem que sofre um acidente automobilístico e passa por todas as etapas do tratamento para a sua reabilitação.

Desde a UTI até o retorno ao convívio social. Foi uma forma de escrevermos uma manual para as pessoas entenderem cada etapa desta recuperação, sem deixar de dar as explicações médicas e técnicas de cada etapa, visando principalmente dar suporte a familiares e cuidadores destes pacientes, de forma a acolhê-los com carinho e boa informação. Deverá ser lançado ainda este ano. 

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