25 Apr 2024

Publicado em TITO COSTA
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Estamos em 1952. Lauro Gomes inicia seu primeiro mandato de prefeito e eu, como seu auxiliar assumo a Procuradoria Judicial, como, então, o único advogado da prefeitura. São Bernardo ostenta apenas 40 milhões de habitantes, seu parque industrial ainda inexistente num pequeno burgo com a Rua Marechal Deodoro coberta de paralelepípedos, duas mãos de direção, comércio ainda acanhado, tudo por fazer de parte do poder público. As fábricas de móveis como o centro da produção laborial. A Prefeitura funcionava em pequeno prédio na rua Dr. Flaquer, esquina com a Marechal, ali situando-se o gabinete do prefeito numa sala contendo três cadeiras e respectivas mesas de trabalho: uma do prefeito; as outras duas: uma da secretária Rita Zincaglia e outra do procurador, eu. Assim se compunha o núcleo da administração municipal, com a participação do Emilio Baccarat, um "faz de tudo", sem ser funcionário da Prefeitura, amigo do prefeito. Aos sábados, visita do prefeito à cidade, seus bairros, o comércio, as poucas escolas, tudo por fazer, e eu acompanhado-o juntamente com outros auxiliares nesses vôos de reconhecimento de um território a ser ocupado e aproveitado, como foi e com sucesso ao longo de anos. Para o almoço, apenas dois restaurantes: o do Coelho, fora do perímetro urbano e um na Marechal.
Os famosos Frango com Polenta surgiriam muito depois acompanhando o desabrochar de uma comuna que se tornaria a Capital dos Móveis e dos Automóveis, hoje orgulhando-se dos seus quase um milhão de habitantes - seu orgulho e seu grande problema, notadamente para a administração municipal, que nem sempre podia atender às demandas de sua variada população.
Aos sábados, naquele entonces dos 40 mil habitantes, o prefeito percorria o território para seu melhor conhecimento das necessidades dos bairros, da população, sempre acompanhado de auxiliares mais próximos entre os quais eu. Foi então, em razão dessas visitas semanais, que conhecemos e participamos dos momentos iniciais do que se tornaria uma das marcas do município no correr dos tempos: o prato carro-chefe dos restaurantes: o frango com polenta. Essa tem sido até pouco tempo e no correr dos anos, a atração culinária por eles fornecida a milhões de frequentadores locais e dos municípios vizinhos, inclusive de São Paulo. Sempre um cardápio de fartura a revelar a generosidade da população de maioria descendente de italianos.
Agora anuncia-se a "extinção do frango com polenta". Sinal dos tempos. O fechamento de muitos dos grandes restaurantes do município vem ocorrendo a passos largos: o São Judas, da família Demarchi, o Walter ex-prefeito sendo um dos seus principais representantes, encerrou suas atividades há pouco mais de um ano; o Florestal importante pelo tamanho de suas instalações (nele caberia um campo de futebol...), além de outros grandes  e médios, alguns já então se preparando, com tristeza, para encerrar suas atividades, com a concretização  do final dos tempos alegres, festivos, fim da era de ouro do frango com polenta em São Bernardo, onde  nasceu, cresceu, notabilizou-se e notabilizou a cidade que o acolhia.
As Famílias Demarchi, Morassi e tantas outras de origem italiana instalaram grandes restaurantes que mantiveram até pouco tempo, alguns enfrentando dificuldades próprias dos tempos atuais. Com o fechamento e transformação de outros em casas menores, mais comercialmente capazes de enfrentar tempos novos, a São Bernardo das comilanças do frango com polenta vai, para a tristeza de muitos, virando a página de uma história que carimbou na cidade o sucesso e a fama que lhe trouxe no cardápio, hoje ainda gostoso como o dos tempos de ouro que fez a fama da cidade e o enriquecer de tantas e tão numerosas famílias descendentes da velha Itália. Aqui se estabeleceram, criando raízes e impondo sua marca de tradição italiana. Também aqui se instalaram e contribuíram com seu esforço para a fama e o orgulho de uma ascendência de lutadores que engrandeceram o Brasil com decidida dedicação, trabalho e, sobretudo seriedade transmitida por gerações seguidas. Um clima de nostalgia alastra-se por famílias inteiras de sambernardenses, a maioria aqui nascida, sempre cônscios da histórica e decisiva contribuição de seus antecessores familiares que marcaram indelevelmente sua passagem pela cidade com o exemplo de seu esforço e de seu trabalho. E eu registro esses fatos, que acompanhei de perto, junto com Lauro Gomes, seu grande inovador, cuja marca permanece nos recantos e nos encantos da cidade. Acabei, por fim, depois de muitos anos, elegendo-me prefeito num tempo difícil de grandes restrições de liberdade, com sacrifício de muitos irmãos nossos durante a vigência do chamado regime militar, felizmente uma página virada em nossa História. E me orgulho de ter prestado modesta contribuição na administração pública, tendo sempre a inspiração na figura, no trabalho, e na saudade de Lauro Gomes, o "eterno prefeito". Relembrar sua memória e seu trabalho como homem público é importante para conhecimento de gerações que não o conheceram.

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