25 Apr 2024

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TITO COSTA


Perguntaram à escritora Marguerite Youlcenar o que era importante a gente lembrar e ela respondeu: o quintal da nossa infância. Eis a importância das nossas primeiras e mais caras lembranças que se arraigam em nós, em nossa alma, e nos acompanham vida afora.

Não será por nada que grandes escritores se dedicam a fixar em seus livros de memórias passagens mais marcantes de suas infâncias, seus familiares, seus amigos, seus sonhos, suas esperanças. Na minha adolescência encantei-me com as Memórias de Humberto de Campos, escritor maranhense, ao lembrar a casa onde nasceu e cresceu e onde ele “marcava, com um traço de carvão na argila clara, os progressos do meu crescimento”. E falava de seu cajueiro com uma ternura e uma saudade que nos comove até hoje quando se volta ao seu texto.

Despedindo-se da árvore querida ele diz: “Adeus, meu cajueiro! E lá me vou outra vez e para sempre pelo mundo largo onde hoje vivo”.  O escritor viveu longe da casa, muitos anos, adoeceu e morreu em terras estranhas às de seus encantos de menino.  Ernest Renan, francês, deixou-nos suas famosas “Recordações de Infância e Juventude” (1883). Entre nós, Monteiro Lobato encantou-nos a infância com suas histórias do Saci, de Narizinho, da boneca Emilia, falando-nos pelas vozes deles, das coisas boas dos tempos de criança, a avô dona Benta contando a eles e a nós as travessuras que envolvem as vidas de todos na simplicidade de nossas recordações e de nossos desenganos.

Gilberto Amado, sergipano, fez A História de Minha Infância que abre com um pensamento do inglês John Milton, do Paraíso Perdido: “A criança revela o homem assim como a manhã anuncia o dia”.  Fala da casa onde nasceu, da rua da infância, do relógio da sala que batia tristemente as horas e dos degraus para menino cair e ficar de galo na testa. Um primor de lembranças essas memórias de Gilberto Amado.

Um capitulo dedicado À Santa Missão revela  toda a sua vila tomada de misticismo, os frades ameaçando os pecadores com o fogo do inferno e a triste cantoria, na plangência das ladainhas, pelas ladeiras empilhadas de gente: “Piedade, Senhor, Tende piedade, É de nóis pecadô...”. 

E ainda, entre tantos, há o inesquecível jornalista Carlos Lacerda, combativo, ágil na palavra e na ação, com suas memórias registradas em A Casa do Meu Avô, onde foi criado e passou a infância, lembrando da “paisagem das últimas neblinas e do primeiro pássaro que canta no verde constante dos pinheiros. É um bafo quente de infância que nos vem da beira lamacenta do Paraíba, do maciço azul do céu, do destroçado perfil daquela casa, do vulto do meu Avô. Tenho pena dos que não tiveram um Avô. Esses bem cedo ficam adultos.

Assim, tardam muito a descobrir o país da infância”. País maravilhoso, de sonhos e aventuras, quando temos apenas certezas, nunca dúvidas. Mas estas virão, por certo, a emoldurar com indiferente frieza este nosso muitas vezes doloroso oficio de viver.

Tito Costa é advogado, ex-prefeito de São Bernardo do Campo e ex- deputado federal constituinte de 1988. E-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Última modificação em Sexta, 21 Janeiro 2011 18:49
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