23 Apr 2024

Publicado em TITO COSTA
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22/12/12

No Seminário de Pirapora do Bom Jesus onde me enfiaram aos treze anos de idade, ouvia dos padres toda a sorte de ameaças e castigos para os pecados da carne. Melhor dizendo, para os pecados contra a castidade, os tais pecados do sexo. Como se o sexo fosse uma espécie de maldição em nossos corpos e não o instrumento criador da vida, fonte dos prazeres do corpo em suas manifestações de amor, nas naturais relações homem-mulher.  As ameaças dos padres vinham nos sermões das missas de domingo, no confessionário (obrigatórias confissões semanais), nas aulas, sempre envoltas na presunção de que, adolescentes, em plena puberdade, estaríamos nas masturbações cometendo pecado contra a castidade e ofendendo a Deus.  E lá vinha a invocação ao Evangelho de Matheus, segundo o qual "quem olhar para uma mulher e desejar possuí-la já estará praticando adultério em seu coração" (Mt 27.28).
Num interessante livro sobre carta que Floria Emilia escreve ao seu amante Aurélio Agostinho (sim senhor, santo Agostinho), Jostein Gaarder, autor de "O Mundo de Sofia", revela-nos curiosas passagens da vida e das aventuras amorosas de um dos maiores filósofos e teólogos do cristianismo, precisamente, o autor do clássico Confissões.  O livro de Gaarder intitula-se Vita Brevis (Companhia das Letras/São Paulo-1998).
A carta de Flora Emilia para Agostinho, pai do filho de ambos Adeodato (dado a Deus) é escrita em latim e o autor conta que a adquiriu num sebo em Buenos Aires, no conhecido Bairro Santelmo, em 1995.  O Codex Floriae, tem esta introdução: "Saudações de Flória Emilia a Aurélio Agostinho, bispo de Hipona". Agostinho foi obrigado por sua mãe Mônica (depois, santa Mônica) a abandonar Flória, sua amante durante anos, a fim de se casar com uma jovem ainda impúbere. No Livro VI, 15, das Confissões escreve ele: "Quando de mim foi arrebatada a mulher com quem vivia, meu coração que lhe era afeiçoadissimo, ficou profundamente ferido e sangrou por muito tempo".  Diz ela, em texto comovente, que "tentaria engolir a desgastante palavra ´continência` que ainda reside em sua mente (dele) como um fardo pesado". Lembrando que Deus não criou o homem para se castrar Flória se diz assediada pelo medo "daquilo que os homens da Igreja possam um dia fazer a mulheres como eu". É dos teólogos que tenho medo, brada ela, "pois aquele que faz mal a alguém ameaça a todos", citando palavras das Confissões, onde Agostinho fala da "concupiscência dos olhos" (Confissões, X, 35).  E acrescenta ela: "Renuncías ao amor entre homem e mulher, mas o fazes em nome de Deus; e se Ele existe, que te perdoe, mas talvez venhas a ser julgado um dia por todas as alegrias da vida às quais deste as costas".
Para tornar-se santo e não mais pecar contra a castidade, Agostinho devia casar-se com a menor impúbere, por imposição de sua mãe, e esquecer Floria. Tem razão nosso poeta Mário de Andrade: "existirem mães, isso é um caso sério, pois a mãe atrapalha a vida da gente". Principalmente, quando mães são prepotentes e dominadoras, como a Mônica, mãe de Agostinho, festejado doutor da Igreja.

Tito Costa é advogado, ex-prefeito de São Bernardo do Campo e ex-deputado federal constituinte de 1988. E-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Última modificação em Sexta, 21 Dezembro 2012 14:16
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