20 Apr 2024

Publicado em TITO COSTA
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No seu livro “O Tempo e o Vento”, a saga da gente dos pampas, Érico Veríssimo lembra o Eclesiastes, Livro da Sabedoria, onde a existência do vento é comparada à existência dos homens: “Geração vai e geração vem; mas a terra permanece para sempre. O vento vai para o Sul e faz o seu giro para o Norte; volve-se e revolve-se na sua carreira e retoma ao mesmo lugar” (Ec, 1, ns. 4, 5, 6). Manoel de Barros, poeta matogrossense, amigo meu já falecido, que se diz “judiado de ventos”, fala de “lobisomens, assombração propícia no Pantanal”: “Há quem os tenha visto. Vento que sopra na folha do rancho pode que seja”. Nosso saudoso radialista Pedro Geraldo Costa, o das famosas Ave-Marias, à seis da tarde na Rádio Record, voltando de uma viagem à Terra Santa informou-nos ter feito uma entrevista com o vento, coisa bonita, poética, que se perdeu, por certo levada pelo próprio. A poeta chilena Gabriela Mistral (batizada Lucila Godoy Alcayaga, Prêmio Nobel de Literatura em 1945) escolheu o pseudônimo inspirada no vento mistral, que percorre o sul da França. Ela declarou, em entrevista, sentir grande amor pelo vento, elemento mais espiritual que a própria água e por isso colocou o vento em seu nome. Um vento que não fosse furacão, simples brisa. Assim: “Passa a brisa na roseira/beijando quanta flor tem/e vai beijar o teu rosto/pensando que é flor também”.
O Simum que sopra no deserto já deu filme de cinema. Siroco é vento que circula pelos lados da Itália e da Grecia, enquanto o Tornado, tempestuoso, e destruidor, costuma castigar regiões centrais dos Estados Unidos. Temos também nossos ventos: o Minuano dos pampas gaúchos, meio-irmão do Pampeiro, na Argentina.
A voz dos ventos, as estripulias do vento, o perfume das flores que ele faz circular com suas aragens refrescantes e saudáveis, tudo isso se constitui motivo para a louvação dos poetas e cancioneiros. Nosso Monteiro Lobato, no livro infantil O Saci lembra as diabruras do vento e dos rodamoinhos que faz, mantendo em seu bojo a figura do duende de uma perna só com suas artimanhas e molecagens. E o Saci, dentro do vento, podia ser capturado com uma peneira. Coisas do Lobato. Pena que a criançada de hoje prefere o celular, o computador e seus mecânicos encantos.
Saint-Exupéry, poeta da aviação, reclama da solidão dos desertos com seus ventos gelados à noite, para lembrar que “o império do homem é interior”. Seu avião teve pane no deserto onde ficou dias e noites à espera de socorro, bebendo pelas manhãs a água do sereno colhida pelas asas dele.
As expressões “bons ventos o levem”, ou “que bons ventos o trazem?”, ditas a amigos que chegam ou que se vão, é manifestação das jamais desmentidas hospitalidade e solidariedade da gente brasileira.
Esta crônica, certamente, terá o destino de tantas outras que o vento leva e são, de logo, esquecidas. Sempre foi assim, e assim será sempre. Arteirices do vento.

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