19 Apr 2024

Publicado em TITO COSTA
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A revista Veja na edição de dezembro de 1991 publicou nas Páginas Amarelas curiosa e comovente entrevista de Amaro João da Silva, um sofrido nordestino dos sertões de Pernambuco. As páginas amarelas dessa revista semanal são reservadas para entrevistas de grandes e importantes figuras da ciência, das artes da política, em todo o mundo. É o espaço nobre dessa prestigiosa publicação, motivo pelo qual já causou estranheza aos leitores, nessa página especial, os relatos desse pobre homem, esquecido num mundo perdido dos sertões nordestinos.
Amaro João é quase um anão com 1 metro e 35 cm de altura, analfabeto, ali vivendo em casa rústica, com a mulher e seus 13 filhos. Ganha 20 reais por mês, segundo ele mesmo disse, passa fome o ano inteiro, trabalha nos canaviais de uma usina de açúcar. Explicou que não sabia o nome do presidente da República, viu televisão uma única vez, tinha um rádio de pilha quebrado que deu como presente de casamento a uma de suas filhas. Disse ao jornalista que o entrevistava: ”Sou explorado pela Usina, trabalho ali há 23 anos, não tenho nada de meu; vou morrer como nasci, nu e com fome”. Há uma foto de João com a entrevista mostrando melhor que palavras, estampadas em seu rosto, as rugas do sofrimento e do desengano. Há pureza e sinceridade em suas lamentações ao dizer que acredita no Céu para onde vão as pessoas boas “porque alí só são aceitas pessoas de bem”. Para ele, “o céu é um lugar bonito onde Deus mora. As almas boas vão para lá, cada uma fica no seu cantinho triste, descansando. As almas ficam tristes porque já não podem comer nem beber, nem namorar”.
A fome é uma constante em sua vida, na da mulher e de seus doze filhos, já que uma se casou e se foi. Ele ensina aos filhos respeitar os mais velhos, não tirar a vida de ninguém, e que devem aprender a lei e escrever para não serem explorados como ele. Com a maior candura do mundo diz que é bom dormir para não sentir fome; acorda às quatro da manhã para ir trabalhar. Depois de 2 horas de caminhada chega com a mulher ao serviço e, terminada a tarefa, volta para casa para dormir às 7 horas da noite em um dos dois quartos da casa com a mulher e o filho mais novo. Os demais 11 filhos dormem no outro quarto em duas camas. Diz que “aos domingos, quando não vou trabalhar no roçado tomo dois copos de cachaça, tomo banho e vou dormir”.
E assim vive na mais perversa miséria esse infeliz com sua família, esquecido de Deus e dos homens, pária de um mundo de cobiças e maldades, ignorado e pisado, humilhado em sua dignidade de pessoa humana. E, como tantos milhões de nordestinos, esperando pelos céus que não lhes mandam nem chuva nem esperança.
Seria a vida de Amaro João da Silva uma obra de ficção? Lamentavelmente, não. Ao contrário, ele, sua mulher e seus 12 filhos, mostram-nos a dura realidade de um mundo com tamanhas desigualdades e tanta indiferença pelo sofrimento de todos os Amaros Joãos, deserdados e confiantes num Deus que não os atende.

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