02/03/13
Já se falou e escreveu demais sobre a renúncia do papa Bento XVI, fato inusitado na história da Igreja Católica. A “mais recente” renúncia de um pontífice ocorreu no longínquo ano de 1294 com a abdicação de Celestino V, depois de ter sido eleito em situação dramática segundo nos informa o “Dizionario Enciclopedico dei Papi”, Editora Citá Nuova, Roma, 1995. Esse interessante Dicionário revela-nos como têm sido disputadas eleições papais ao longo de longa história, pontuadas por toda a sorte de intrigas, traições, ciladas, grupos que se digladiam no colégio dos cardeais encarregado da escolha do sucessor de Pedro no comando da igreja de Cristo. Afinal, são homens e assim sujeitos a todas as fraquezas humanas. Mas agora, como nunca antes, a vida da igreja, seus problemas, as mazelas de seus dirigentes, tenham sido tão expostas publicamente para conhecimento urbi et orbe. Sabe-se, por exemplo que o papa Bento 16 é um teólogo dos mais cultos e preparados, um verdadeiro intelectual, sem nenhuma vocação para administrador de um Estado como é o Vaticano, verdadeiro serpentário, rodeado de feras que se disputam entre si numa voragem de buscas por mando, glórias, riquezas, numa organização milenar de rígida hierarquia e fartas benesses terrenas. A preocupação com a vida eterna se dirige a um outro departamento das pretensões humanas, mesmo em se tratando de servos diretos do Pai, do Filho, e do Espirito Santo.
O jornal italiano La Repubblica vem divulgando boatos que empesteiam os corredores do Vaticano. Como em eleições aqui no Brasil com as intrigas e os dossiês apócrifos, carregados de veneno contra candidatos, lá também segundo o referido jornal, há lobbies dos “bandos” (sic) que se digladiam, quer seja pelo controle do banco do Vaticano, quer seja pela orientação eclesiástica ou teológica. Afinal, toda a agitação que precede uma eleição papal está posta à mesa. E é justamente essa briga pelo poder, as intrigas que a cercam, as traições, os apetites incontroláveis, que teriam levado Bento 16 à certeza da fragilidade de suas forças para conter tanta ambição desmedida. Daí, a renúncia. Sem se falar de escândalos em matéria sexual em relação ao que o atual papa se sente impotente para conter e evitar.
Na sua última mensagem pública de despedida, em 27 de fevereiro de 2013, o papa repetiu a pergunta que fizera quando visitou o campo de extermínio de judeus em Auschwitz: onde estava Deus nessa hora? Agora disse que Deus parecia estar dormindo, alheio à crise de Sua igreja. Consta dos textos sagrados, que aprendemos desde o primeiro catecismo, que Cristo ao fundar a Sua igreja entregou-a a Pedro com estas palavras: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja; e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”. Ao que tudo indica, as portas do inferno estão agora escancaradas lá pelos lados da Santa Sé.
Tito Costa é advogado, ex-prefeito de São Bernardo do Campo e ex- deputado federal constituinte de 1988. E-mail: antoniotitocosta@uol.com.br