José Renato Nalini Opinião

A trama das árvores

O Brasil ainda tem árvores milenares. São poucas, mas existem. Resistiram à sanha dendroclasta dos fabricantes de desertos. Somente a ignorância disseminada na República onde setenta por cento de seus habitantes são analfabetos funcionais é que justifica o desmatamento.

   Os negacionistas do ogronegócio, não do agronegócio saudável, que tem noção da necessidade de cobertura vegetal nativa para o bom desenvolvimento do cultivo, deveriam ler o livro “A Trama das Árvores”, escrita pelo escritor Richard Powers. Ele abandonou o seu emprego na Universidade Stanford para ir morar no parque Gret Smoky Mountains, no leste dos Estados Unidos e se pôs a estudar as matas de seu país.

   Ali também, quase cem por cento – mais exatamente, noventa e nove por cento – da floresta primária original foi cortada. Existem minúsculos nichos que podem mostrar como a mata já foi. E ali se respira outro ar, sentem-se outros aromas, os sons indicam a vida silvestre. Um outro ambiente, completamente diferente da nociva convivência nas cidades impregnadas de gás carbônico e outros venenos que vão causar o efeito estufa e provocar cataclismo ambiental.

  O livro que Powers escreveu é um romance com oito histórias paralelas ao longo de décadas e de séculos. Foi publicado em 2018 nos Estados Unidos e mereceu o Prêmio Pulitzer de ficção, além de ter vendido mais de dois milhões de exemplares pelo mundo. E a originalidade está em que as plantas são as personagens. O livro reproduza história da interdependência e da rede de reciprocidade que existe no mundo.

   Para ele, “não podemos entender a nós mesmos se não for em alinhamento com nossos vizinhos não humanos. Não somos uma história separada e não podemos nos narrar assim”.

   Os ignorantes não respeitam as árvores. E elas estão aqui há quatrocentos milhões de anos, enquanto os humanos modernos estão aqui há, no máximo, duzentos mil anos. A Terra é uma história de árvores há duas mil vezes mais tempo do que ela é uma história do bicho-homem.

   Árvore não é coisa. Árvore é vida. Quem mata uma árvore está acabando com a vida e, ainda que não saiba, apressa a sua própria partida deste planeta que nos hospeda, a nós, inquilinos infiéis e traiçoeiros.

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