O Brasil acordou em festa, na segunda (6), após a conquista do Globo de Ouro de melhor atriz em filme de drama, no domingo (5), por Fernanda Torres, em sua atuação no longa-metragem Ainda estou aqui.
A vitória é inédita para o País na categoria. Essa é a primeira conquista do Brasil no Globo de Ouro desde 1999, ou seja, há 25 anos, quando “Central do Brasil”, com Fernanda Montenegro (mãe de Fernanda Torres) venceu como melhor filme em língua estrangeira. Na ocasião, Fernanda perdeu o Globo de Ouro naquele ano para Cate Blanchett, por sua atuação em “Elizabeth”.
Agora, Fernanda Torres desbancou as renomadas atrizes Nicole Kidman (que concorria com o “Babygirl”), Angelina Jolie (“Maria Callas”), Kate Winslet (“Lee”), Tilda Swinton (“O quarto ao lado”) e Pamela Anderson (“The last showgirl”).
O longa Ainda estou aqui é uma produção do Globoplay, dirigido por Walter Salles. Fernanda Torres revive a história real da advogada e mãe do escritor Marcelo Rubens Paiva, Eunice Paiva, que passou 40 anos de sua vida procurando a verdade sobre seu marido, Rubens (interpretado por Selton Mello), desaparecido durante a ditadura militar no Brasil.
No filme, Eunice Paiva se vê diante de um dos maiores desafios de sua vida. Seu marido, Rubens, é levado pela polícia para prestar depoimento e jamais retorna à sua casa. Mãe de cinco filhos, Eunice, sozinha, precisa enfrentar as consequências do ocorrido, continuar a educar os filhos, cuidar da rotina da casa e, ainda, enfrentar a impossibilidade de ter acesso a informações sobre seu marido e, até mesmo, a própria conta bancária, tendo que conviver com agentes do governo militar instalados dentro de sua residência, vigiando sua família.
Com o passar do tempo e a falta de informações sobre o marido, Eunice e os cinco filhos deixam o Rio de Janeiro, se mudam para São Paulo para recomeçar a vida. Décadas se passam, a família enlutada aprende a olhar para frente, mas sem perder de vista o passado. Apenas em 1996, após 25 anos de luta por memória, verdade e justiça, Eunice obteve que o Estado brasileiro emitisse oficialmente o atestado de óbito de seu marido Rubens Paiva.
A interpretação de Fernanda Torres é impecável, com leveza, discrição, mas notável força de superação e resistência às adversidades. Poucos filmes ilustram de forma tão singular os efeitos permanentes deste tipo de tragédia sobre as pessoas que ficam para trás. Ainda Estou Aqui revela o luto sem fim vivido por uma família, mostrando como as ações políticas e suas repercussões podem tirar a vida das pessoas completamente dos trilhos.
A situação real enfrentada por Eunice de Paiva, e interpretada por Fernanda Torres, não é novidade para os brasileiros. Durante a ditadura militar, que durou de 1964 a 1985, o país viveu os anos mais tenebrosos de sua história, período marcado por violações dos direitos humanos e repressão.
No Brasil, mais de 20 mil pessoas foram torturadas e mortas pela ditadura militar, sem que os torturadores fossem sequer punidos, até hoje. “Mata-se uma pessoa e condena-se toda a família a uma tortura psicológica eterna,” diz Eunice Paiva, em um dos trechos do filme.
Apesar disso, muitos parecem ter se esquecido ou não se lembram muito bem sobre como era viver e conviver com entes familiares e amigos sendo retirados de seus lares familiares para prestarem depoimentos e serem torturados até a morte. Nem sobre a repressão e a sensação diária de viver com medo, tensão e pavor de conviver com prisões arbitrárias, torturas, estupros e assassinatos realizados pelas forças militares e policiais no país. Um período tenebroso da história brasileira, que jamais poderá acontecer, novamente. Ainda estamos aqui, sem ditadura militar, e que assim, possamos permanecer.
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