O livro de Laurentino Gomes sobre a Escravidão no Brasil desde os primórdios do descobrimento e, principalmente, a partir do século XVII, é impressionante na medida em que nos relata com dados concretos toda a maldade que perdurou até a abolição da escravatura oficialmente em 1888 com a chamada Lei Áurea. Até então o Brasil viveu um tempo de completa e terrível exploração da mão de obra escrava, os escravos tratados como se fossem coisa e não gente. E tudo se fazia com as bênçãos da Igreja, com conhecimento e autorização de papas, dentro do que se chamava a “moral cristã da escravidão”, baseada em projeto escravista de autoridades e entidades religiosas, pois tudo era feito, como diziam, “ad majorem Dei gloriam” (para a maior gloria de Deus). É claro que Deus entrava nessa história sem saber de nada o que se passava nas maldades que cercaram todo o período em que vigorou a exploração desenfreada da mão de obra escrava. Escravo não era tratado como pessoa humana, mas como objeto que tinha preço e servia aos “senhores” que dele dispunham segundo sua conveniência. Sabe-se agora, se não se soubesse antes desse registro cruel do escritor, que até mesmo o padre Antonio Vieira adotou a escravidão como se fosse um ato de servir a Deus, com aprovação de ajuda dos jesuítas que ajudaram a construir a base ideológica do projeto escravista dos religiosos tudo “para resgatar as almas dos cativos do pecado e aliviar o seu sofrimento no cativeiro”. E ponha-se “alivio” nessa conversa que, no mínimo era manifestado pela colocação da marca de seu dono na cara do infeliz. E nada de descanso porque “o ócio é a escola onde os escravos aprendem a ser viciosos e ofender a Deus”. Como sempre, Deus comparecia para justificar e abençoar as violências com que eram tratados. “e… como os pretos são mais hábeis para o gênero de maldades que os brancos, por isso saem grandes licenciados do vício na classe do ócio”.
É curioso, para não se dizer da falsidade de religiosos no trato da escravidão, que “entre os séculos XV e XVI seguidas bulas papais deram a justificativa religiosa e o respaldo político de que os portugueses precisavam para conquistar novos territórios na África e escravizar seus habitantes”. O Papa Nicolau V chegou a autorizar o rei de Portugal a conquistar e subjugar os pagãos e outros “inimigos de Cristo” a capturar e escravizá-los, obrigando-os a transferir suas terras para a Coroa Portuguesa de forma perpétua (pág. 343).
Há muito o que comentar e transcrever esse texto de Laurentino Gomes, mas o espaço termina e vamos transcrever outras tantas maldades em próximas referências.