
(Foto: Divulgação)
“Gigantes para Gigantes”, o videocast apresentado pela jornalista Carol Barcellos, traz, no segundo episódio uma das referências da ginástica artística brasileira: Diego Hypólito, primeiro atleta do país a conquistar o ouro num Mundial da modalidade e medalhista olímpico. Num longo e descontraído bate-papo, ele revela suas origens humildes que o levaram a ser um gigante pela própria natureza. E garante que, aos 11 anos de idade, já sabia quem seria e se tornaria, fruto da determinação diante da realidade que a vida lhe impôs tão cedo.
Na entrevista, a superação do pequeno Diego diante das dificuldades que batiam à porta da sua família foi o assunto que logo veio à tona. Afinal, foi a partir dali que já se começava a desenhar uma personalidade gigante. A realidade, naqueles tempos, não era nada fácil. Falta de energia elétrica em casa, por exemplo, era comum. Para ajudar os pais, ele voltou no tempo para lembrar, com orgulho, que chegou a ser vendedor ambulante em Copacabana, famoso bairro da Zona Sul do Rio de Janeiro. Até cair a ficha, num dia marcante e decisivo.
“Uma data específica me marcou, quando não tínhamos o que comer em casa. Às vezes, nem arroz e feijão. Nesse dia, minha mãe conseguiu uma lata de leite condensado com a vizinha e, com o bico de gás, dissolveu com água, que era do prédio, por isso não foi cortada, e foi o leite que nos alimentou para irmos treinar. Morávamos no Flamengo e treinávamos no clube, que fica na Lagoa. Muitas vezes, íamos andando. Tudo isso me fez valorizar demais os treinos. Eu já era uma criança que sabia fazer um mortal de costas com 5 anos de idade. Desde muito cedo sabia o que queria. Dei uma entrevista, já aos 11 anos, dizendo que seria campeão do mundo e medalhista olímpico”, disse.
Mas a vida pregaria outras peças e moldaria Diego até ele se tornar um gigante e referência no seu esporte. Ele era o atual campeão mundial no solo quando disputou a primeira de suas três Olimpíadas, em Pequim-2008. Na final do seu aparelho favorito, para a qual havia se classificado com a melhor nota, uma queda inesperada e a frustração. Um momento dos mais difíceis de uma ainda curta carreira. Sofrimento, cobrança absurda nas ruas, dúvidas. Tudo muito dolorido, mas aquele atleta de 22 anos teve que reverter tudo aquilo a seu favor.
“Eu me lembro que muitas pessoas, até de idade, diziam para eu não desistir. Eu não iria desistir dos meus sonhos, mas cheguei a apanhar na rua porque caí nos Jogos Olímpicos, e isso não é uma coisa que considero natural. Eu não era um criminoso. Eu me tornei um atleta celebridade na época e tinha que me colocar no lugar de atleta. E acho que essa queda foi uma das maiores vitórias da minha vida, porque colhi todos os frutos do que deveria e tinha que fazer. Só que no início não foi bem assim. Eu me perdi e falei ‘caramba, eu nunca mais vou conseguir’. E não havia na época uma conversa aberta como se tem hoje sobre ansiedade”, revelou Diego à Carol Barcellos.
Veio a Olimpíada seguinte, Londres-2012. Com lesão óssea nos dois pés, Diego estava de muletas na véspera da estreia nos Jogos. “Mas eu nunca desistiria. Estava fragilizado, quebrado por dentro, mas falava para todos que daria certo. Mas eu era cruel comigo mesmo. No fundo, já sabia que não daria”. Veio a classificatória no solo e uma nova queda, desta vez de cara. “Ali eu falei: acabou minha carreira. Nunca mais terei uma nova oportunidade”. Ele lembra que o tablado até aquele ano não tinha mola, era duro, de muito impacto, que não ajudava a impulsionar, era mais para amortecer, daí as graves lesões que teve.
Diego revela que disputou Jogos Rio-2016 com duas fraturas na coluna – Mais uma página virada. Novas competições e medalhas vieram, como o bronze no Mundial de 2014 e pratas em etapas da Copa do Mundo em 2015, tudo no solo. Mas toda a caminhada até ali, de treinos intensos, fez Diego ter oito hérnias. Ninguém sabia, até ele revelar para Carol, que competiu nos Jogos Rio-2016 com duas fraturas na coluna. “Quando as pessoas leem minha biografia acham ela triste, mas digo que ela é real”. Por muito pouco, inclusive, não ficou fora da Olimpíada dentro da nossa casa, por muitos já não acreditarem mais nele.
“Sei que existia uma conspiração contra mim, de as pessoas não acreditarem que eu seria medalhista olímpico. Eu me classifiquei para os Jogos do Rio porque tinha um dirigente do Comitê Olímpico Brasileiro que acreditava em mim. E o Henrique Mota, hoje presidente da Confederação Brasileira de Ginástica, também. Mas o público brasileiro foi muito decente comigo, por mais que alguns não torcessem a favor. Consegui minha vaga para mais uma Olimpíada, com a nota 15.500”, comentou ele, admitindo uma memória invejável.
Chegou o grande momento. “Eu só queria ficar de pé, só queria acertar”. Ele precisava mostrar que aquele sonho da medalha olímpica era possível, depois de tanta adversidade, agora já aos 30 anos. O medo, claro, o acompanhava. Era muito medo. Normal. Na classificatória do solo, Diego se garantiu na final com a quinta melhor nota. “Não acredito que estou na final no Brasil, diante da minha torcida e da minha família!”. E, a caminho do tablado, aquele mesmo menininho humilde, que ajudou os pais tão cedo, seguiria para sua última apresentação.
“Lembro que, quando subi os degraus, minhas pernas estavam tremendo. Ajoelhei nessa hora e fiz a mesma coisa que fiz no Mundial de 2014: eu me xinguei. E disse para mim mesmo: você merece estar aqui, não seja idiota, vai lá e faz a sua parte. Quando levantei, sabia que acertaria minha prova. Minha primeira acrobacia foi a que caí de cara em Londres. A segunda, a que caí de bunda em Pequim. Enfrentei todos os meus fantasmas. Fui medalhista e vi ali que tudo é possível”.
Mas a trajetória de superação em Olimpíadas não foi o único assunto. Diego contou a ajuda que a família teve de Ronaldo Fenômeno, que foi quem bancou a primeira viagem da irmã, Daniele Hypólito, que passaria a ser reconhecida mundialmente ao ganhar a primeira medalha da história da ginástica brasileira. Admitiu que quebrou financeiramente na pandemia e foi despejado. “Perdi tudo, menos minha saúde, o que me fez voltar a trabalhar”. Virou empresário, tem o próprio instituto, dá palestras e vai até estrear um programa dirigido por Marlene Mattos.
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