09/03/13
Meu amigo Ray-mundo Farias de Oliveira, escritor, poeta, violonista brilhante, advogado idem, manda-me crônica que publicou no periódico O Imparcial, de Presidente Prudente, com o titulo acima. Também andei descalço nas areias de Torrinha, na infância alegre e despreocupada feita de inocentes aventuras como nadar no Saltinho, inteiramente nu, com as naturais brincadeiras carregadas de malícia e muito bom humor. Depois, era voltar para casa e fingir para a mãe que nada de especial havia acontecido. E, para disfarçar o cabelo molhado, usava-se o “pente de macaco”, uma pequena vareta de mato que era passada pela cabeleira até que a umidade desaparecesse.
Andar descalço, que delícia. Observa Raymundo que “o suplicio acontecia na hora de ir para a escola. Instante em que os pés despojavam-se da liberdade gostosa e se submetiam às torturas da botina ou do sapato, este para os mais abastados do lugar”. Ele fala das botinas “ringideiras” que doíam nos pés e ainda faziam zoada. Depois vieram os tênis cuja fabricação foi incrementada pelos americanos com a sofisticação de modelos e “agora – diz ele – vejo a humanidade andando de tênis (no meu tempo de ginásio eram quedes, no plural)”. De meu lado, acho horrível ver senhores de terno e gravata usando tênis, como se fosse a coisa mais bonita do mundo. Mas a moda pegou, como uma praga que abarca homens, mulheres, crianças.
Mas a crônica de Raymundo, além do sabor das lembranças somente degustadas e saboreadas pelos meninos da roça, ou das pequenas cidades como Torrinha, como eu mesmo vivi e senti, tem ela, também, uma deliciosa tonalidade poética: “Por isso, evoco os meninos descalços daquele tempo, quando andávamos nas ruas pisando o areão macio , onde os pardais madrugadores brincavam distraídos, dando cabriolas, para enfeitar a pureza de nossa meninice”. Só mesmo quem viveu essa deliciosa aventura saberá entender aquilo que para a meninada de hoje, das cidades, não passa de algo improvável em tempos de tablets, videogames, ipads, ipods, etc., com a violência saltando das pequenas telas, sem terem conhecido e ouvido o “ringir” gostoso dos velhos sapatões caipiras.
Tito Costa é advogado, ex-prefeito de São Bernardo do Campo e ex- deputado federal constituinte de 1988. E-mail: antoniotitocosta@uol.com.br