Médico especialista da FMABC defende a construção do equipamento na região

A maioria das crianças diagnosticadas com câncer do ABC e da Baixada Santista não conseguem atendimento nas localidades e precisam se deslocar à São Paulo em busca de tratamento. A realidade é cruel, por ano são mais de 10 mil novos casos de câncer infantil.
Jairo Cartum, médico e professor universitário, especialista em pediatria e oncologia pediátrica e atualmente docente responsável pela Oncologia Pediátrica do Centro Universitário da Faculdade de Medicina do ABC, em entrevista exclusiva, comentou sobre os tipos mais comuns de câncer em crianças e adolescentes, a importância do diagnóstico precoce e a luta para construção de um hospital oncológico infantil na região. Confira.
Folha do ABC – Qual a sua relação com a Oncologia Pediátrica?
Jairo Cartum – Sempre sonhei em poder cuidar do próximo. Mas, escolhi a oncologia porque presenciei meu avô com câncer de pulmão, quando eu tinha 13 anos. Presenciei ele no hospital, sofrendo com falta de ar. Tinha um vínculo muito intenso com ele. Falei que iria cutucar a doença de alguma maneira e é isso que nós fazemos no dia a dia. Quando não conseguimos curar, conseguimos cutucar a doença. Foi tipo uma vingança positiva dessa doença. Relembro meu avô no hospital e quando estou com um paciente relembro toda aquela situação vivida com ele. E é muito gostoso trabalhar com criança, por isso escolhi a oncologia com pediatria.
Folha – O câncer é a principal causa de morte por doença em crianças e adolescentes no Brasil. Quais são os tipos mais comuns de câncer em crianças e adolescentes?
Cartum – A oncologia pediátrica não é tão frequente quanto no adulto. Temos em torno de 10 mil casos ao ano, enquanto que o adulto temos 600 mil casos ao ano. Na infância, o tipo mais comum de câncer são as leucemias, que correspondem a 1/3 das neoplasias da infância, seguido pelos tumores cerebrais, com 20% mais ou menos, e 15%, os linfomas. Os outros 2/3 restantes são tumores de rim, suprarrenal, de ossos, de fígado, retina e assim por diante. Mas, o principal, indiscutivelmente, é a leucemia.
Folha – Quais os sintomas da doença que devem servir de alerta para os pais?
Cartum – O câncer infanto-juvenil não tem um sintoma específico da doença. Ele mimetiza os sintomas de qualquer doença na infância. Devemos desconfiar quando aquele sintoma piora rapidamente, porque é uma doença que evolui muito rápido. Uma dor de barriga, que hoje é fraca, a criança diz que dói, mas vai brincar. Daqui uma semana, ela já começa a chorar. Neste caso, precisa investigar, pode ser um tumor de fígado, de rim, de suprarrenal ou não ser nada. Com a dor de cabeça, a mesma coisa. Assim como a febre com mais de 10 dias pode ser de origem tumoral. A grande dica: aquele sintoma que se mantém, piora ao longo do tempo e rapidamente, tem que ser investigado. O tumor na infância se multiplica uma vez por mês. A maioria das vezes o sintoma não é de origem oncológica, mas se for, precisa fazer o diagnóstico precoce, porque quanto mais cedo, maior a chance de cura desse paciente.
Folha – E qual a importância do diagnóstico precoce?
Cartum – Não basta termos um hospital equipado e fazermos o diagnóstico tardio, porque a doença evolui, ela vira metástase e diminui a taxa de cura significativamente do paciente. Além disso, o diagnóstico tardio faz com que tenhamos que usar mais medicação. As medicações são tóxicas, podem ter efeitos colaterais e causar sequelas. Assim como a doença pode causar sequelas, quanto mais avançada, mais sequelas. Então, se conseguimos fazer o diagnóstico precoce, além de curar mais, temos um tratamento menos sofrido, mais curto, mais barato e que vai causar menos sequelas.
Folha – Qual a importância da construção de um hospital para tratamento de câncer infantil no ABC? A presença do equipamento na região faria a diferença nos tratamentos?
Cartum – Eu me formei no GRAAC (Grupo de Apoio ao Adolescente e Criança com Câncer) e fiz minhas teses no ITACI (Instituto de Tratamento do Câncer Infantil). Quando fiz GRAAC, nós não tínhamos um hospital de oncologia pediátrica. Tínhamos aula no corredor da enfermaria do Hospital São Paulo e víamos as dificuldades que tinha. Vi nascer o GRAAC e o ITACI e vi a diferença em termos de prognóstico com o incremento desses hospitais de oncologia pediátrica. É um importante, não só no Brasil, como no mundo, termos um hospital regional que atenda as crianças e adolescentes com câncer. Isso muda bastante o prognóstico. Na região do ABC e Baixada Santista, não temos ainda nenhum serviço nesses moldes, é necessário e imprescindível isso. É um sonho, uma luta desde que cheguei no ABC, há mais de 20 anos. É possível e viável, vamos mudar o prognóstico do paciente. Queremos curar uma criança, com qualidade de vida, com prognóstico sem sequelas.
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